domingo, janeiro 30, 2005

Gente Como a Gente

Alguns filmes a gente assiste. Outros a gente sente. Na verdade essa frase é da própria divulgação do filme, mas não existem palavras no dicionário para descrever melhor essa comovente história sobre um garoto com problemas com sua família. O que dizer a respeito desse filme? Sinceramente é difícil. Ele continua nos acompanhando mesmo depois de algumas horas, fazendo- nos pensar sobre nossa vida e nossa família. A música Canon in D major continua tocando na nossa cabeça por um bom tempo, lembrando a gente do garoto correndo deseperado pelas ruas ou então o mesmo abraçando seu médico em lágrimas.

Esse garoto se chama Conrad Jarrett e perdeu seu irmão mais velho em um acidente de barco, desatre este em que ele também estava. Conrad se deprime, chegando até a tentar suicídio. Sua mãe o trata com indiferença e seu pai mais parece o Bob Esponja: está tudo muito bom, estão todos muito bem, alegria! alegria!. A partir dessa tese começamos a viver a história do garoto, seu relacionamento com os amigos, com as garotas, com os estudos... o diretor estreante Robert Redford nos coloca dentro da casa dos Jarrett, não escondendo os podres dessa família normal como qualquer outra.



É difícil dizer o que torna Gente Como a Gente um excelente filme. Pode ser a direção sublime de Redford, pode ser o roteiro intimista de Alvin Sargent (que também adaptou o excelente Homem Aranha 2), podem ser as atuações soberbas do quarteto principal, pode ser simplismente pelo filme retratar gente como a gente. Podiam ser outras dezenas de coisas passadas a nós durante os 123 minutos, mas é difícil achar algo para destacar. Tudo soma para um belo e tocante resultado final.

O roteiro é adaptado de um livro homônimo de Judith Guest, que ganhou um tom mais pessimista quando foi transportado para a tela. O destaque para o script são os diálogos entre Conrad e Dr Berger e os entre Beth e Calvin, pais do garoto. O ator Timothy Hutton, então com 20 anos, consegue emocionar até o mais durão espectador, sendo a perfeição em cena, não menos que isso. Os atores Donald Sutherland e Mary Tyler Moore não ficam atrás interpretando o resto do resto da família, sendo necessário dizer que por uma cruel ironia Mary Tyler perdeu seu único filho em um acidente com uma arma antes de filmar Gente Como a Gente.

É curioso que um dos primeiros filmes a retratar os problemas das pessoas comuns seja dirigido por um ator mais que acostumado com o glamour das grandes produções hollywoodianas, como Butch Cassidy, Golpe de Mestre e Todos os Homens do Presidente. Mais estranho é ver que em seu trabalho de estréia esse mesmo ator fez algo fantástico, não deixando que um drama sublime não descanbe ao pastelão. Como diz outra frase promocional do filme, tudo está em seu lugar apropriado, exceto o passado. E Gente Como a Gente também está em seu lugar apropriado, no hall dos grandes filmes de todos os tempos.

sábado, janeiro 29, 2005

A Época da Inocência

A Época da Inocência é sobre o caso de amor de Newland Archer (Daniel Day-Lewis) e Ellen Olenska (Michele Pffeifer), prima da noiva dele que chegou há pouco da Europa causando estranhamento na alta e hipócrita sociedade nova-iorquina de 1870. Archer se vê em um confronto entre o tradicional, representado por sua noiva (Winona Ryder, bela porém sem brilho) e o moderno, Ellen. Apesar de ser dirigido e adaptado por Martin Scorsese, seria mais justo creditar o filme ao diretor de arte Dante Ferreti.

O romance e as questões sociais da época são pano de fundo para os belos cenários arquitetados pelo italiano, tanto que até os objetos em cena e a refeição das jantas merecem closes. A cada mansão, prédio e jardim que somos apresentados durante a história nos surpreendemos com a riqueza de detalhes da produção, ajudada pelos trocentos figurinos impecáveis que desfilam diante dos nossos olhos. E Martin Scorsese sabe usar a direção de arte muito bem, explorando ao máximo os cenários, passeando com a câmera por todos os cantos do set. Outro ponto forte do trabalho de Dante Ferreti é a reconstituição da Big Apple do final do século, incluindo um rascunho da Times Square.

A beleza de A Época da Inocência é tanta que a primeira vista até esquecemos um pouco os atores e o conflito entre as personagens, mas a medida que o tempo avança ficamos aprisionados com o drama de Archer, perfeitamente caracterizado pelo inglês Day-Lewis. Michelle Pffeifer dá presença a sua personagem, mas cai no pastelão certos momentos, como na hora em que inexplicavelmente começa a chorar.

A narração que nos guia pela Nova York do século XIX à primeira vista pode parecer preguiça dos roteiristas, mas ela nos fornece detalhes que se fossem filmados transformariam o filme em um longa de quatro aborrecidas horas. Nós mesmos percebemos que Martin Scorsese fez o possível (e conseguiu) para não deixar a história cansativa, seja através da fotografia suave, seja através dos cenários. Apenas a trilha sonora segue o tom da trama nos angustiando as poucas vezes que é tocada. A última ressalva do filme é o forte tapa na cara que ele nos deixa, mostrando como a vida é comum e como a desperdiçamos. Resultado final: descobrimos que a inocência é a nossa, tanto por achar que seria apenas mais um filme meloso, tanto por acreditar que a vida pode ser especial.

terça-feira, janeiro 25, 2005

20.000 Léguas Submarinas

O escritor Júlio Verne é conhecido por ser o autor de histórias fantásticas, como A Volta ao Mundo em 80 Dias, 20.000 Léguas Submarinas e Viagem ao Centro da Terra. Está certo que o francês é um dos autores mais visionários de todos os tempos por escrever sobre viagens à Lua ou ao fundo do mar numa época que nem automóveis existiam, mas agora, colocar suas obras no status de clássico, é brincadeira. Principalmente 20.000 Léguas, uma história entediante que não consegue prender a atenção do leitor uma única vez.
A história conta como o Professor Aronnax, seu amigo Conselho e o bruto Ned foram parar dentro de um enorme submarino que estava sendo confundido com um imenso monstro (na época que a história foi escrita -1870- não existiam submarinos) e levando pânico a todos em terra firme. O tenso do livro é que ele é grande demais para história de menos. São páginas e mais páginas com o Professor pesquisando sobre a vida marinha, e nada mais. Julio Verne passou ao leitor a mesma sensação de aborrecimento e monotonia que as personagens sentiam dentro do reino do Capitão Nemo, o emblemático dono do submarino, e creio que não foi por querer.
O livro do escritor francês ainda é vítima de um ciclo que contribue para a falta de emoção e surpresa na narrativa: eles aprendem algo sobre a vida marinha, acontece algum problema grave, eles se salvam e vão para outro ponto na imensidão azul aprender outras coisas, passar por outros problemas e assim por diante. O mesmo vício chato se faz presente em A Volta ao Mundo em 80 Dias, quando Phileas Fogg ia para um país, sofria alguma coisa, salvava- se e ia para outra terra.
Outro ponto em comum com A Volta ao Mundo é a personalidade, melhor, falta dela, dos melhor amigo da personagem principal. Conselho é talvez a pessoa mais imbecil de toda a literatura mundial, não consegue nem respirar se seu chefe também o fazer, levando sua vida ridícula a aborrecer o leitor mais que o francês Passepartout do outro livro. O próprio Capitão Nemo não funciona, não nos passando o medo que deveríamos sentir dele. Ele entra calado na história, sai mudo e tãtã. Há um certo esforço de passar imponência à figura dele, mas não somos convencidos de sua capacidade de fazer qualquer coisa (inclusive matar) pelo seu segredo.
Há algumas partes que dão uma certa esperança a quem lê o livro que algo irá acontecer, como a visita a Atlântida ou a passagem do Mediterrâneo, mas mera expectativa. Também faltam explicações de quem eram aqueles tripulantes, para onde iam quando sumiam, de onde eles vinham e que raio de língua falavam. Chega uma hora no livro que nós próprios desejamos ser o bronco Ned para podermos enfiar uma faca no Aronnax, outra no Nemo e bater a cabeça de Conselho contra a parede até ele resolver ter vida própria. A única coisa agradável do livro é descobrirmos de onde vem o nome do simpático peixinho da Pixar, muito pouco para um livro com tantas páginas e tanta fama.